segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

ALCOOLISMO "O FIM DE UMA FAMILIA"



Numa pequena e pacata cidade do interior de Minas Gerais morava Jose, casado com Maria, pai de cinco filhos (três homens e duas mulheres). Sua esposa trabalhava em casas de famílias como domestica. Mulher trabalhadeira e muito respeitada na pequena cidade pela sua seriedade, honestidade e também por ser de uma família simples, mas bem conceituada naquele lugarejo.

José amava muito sua esposa, era um pai amoroso, atencioso com os filhos. Porem, um alcoólatra que cada dia o estágio de sua doença aumentava significativamente, isto afetava de maneira profunda o relacionamento do casal. Mesmo havendo um sentimento grande de amor entre ambos o alcoolismo prejudicava o relacionamento dos dois como também influenciava ativamente a vida dos filhos, chegando ao ponto de ser comum os filhos presenciarem discussões e muitas vezes agressões físicas entre eles.

Estava empregado numa empresa de minérios há anos. Quando José recebia o pagamento no final de semana, primeiramente fazia as compras para a família, comprava sempre doces para os filhos, com o que sobrava acaba embebedando chegando em casa completamente bêbado. Era comum, perder alguns produtos da compra na rua.

Jose quando estava sobre efeito de bebidas não era violento, no entanto, transformava-se numa pessoa complemente chata, vivia criando confusões porque falava sempre a mesma coisa toda hora, até tirar a sobriedade de Maria. Ficava criando situações para provocar discussões e depois de armar barracos ia se deitar acordando quando já estava recuperado da bebida, mas com uma grande ressaca. E assim, eram sucessivamente todos os finais de semana. Mas o alcoolismo foi se acentuando cada vez mais que Jose já não conseguia manter uma regularidade no trabalho até ser mandado embora do emprego de anos. Com a perda deste emprego, a saúde debilitada e ainda, todos da pequena cidade conhecendo-o como alcoólatra José não arrumava emprego registrado. A partir daí passou a viver de bicos, raramente conseguia se empregar com carteira assinada. A falta de um trabalho fixo ajudou no aprofundamento do alcoolismo. O casal intensificava as agressões, os filhos assistiam todas aquelas cenas de brigas infinitas.

Certa vez, Maria num final de semana teve uma crise se enfartando, porém, conseguiu sobreviver. Mas, a partir daquele instante sua saúde se comprometeu totalmente. Alguns meses depois teve uma crise psiquiátrica que a levou ser internada em numa clinica para tratamento mental. Deste então, Maria adquiriu uma doença psiquiátrica que a levou varias internações. Muitas destas internações se deram pelo alcoolismo de seu marido. Era comum, quando Maria voltava da clinica com poucos dias entrar em crise psiquiátrica novamente e ter que voltar ao tratamento interno em clinicas, até que seus pais vendo aquela situação que nunca terminava interferiram de maneira radical separando o casal. Com a separação e o estado mental de Maria, a mãe de Jose, Ana Maria acabou assumindo o filho e mais quatro netos, apenas uma ficou vivendo de casa em casa de tios. Os filhos sofreram de maneira particular com o alcoolismo de José, pois com a separação do casal somando-se ainda ao estado mental de Maria e a idade avançada da avó ficaram completamente abandonados à própria sorte.

O tempo foi sucedendo até que Jose também começou a procurar clinicas para tratar-se de sua doença, porém, o alcoolismo era maior que sua vontade, e assim mesmo lutando não conseguia parar de beber. Era comum José ficar quinze, vinte dias até mesmo mês sem pôr álcool na boca, mas quando fazia o primeiro uso recaia ficando quinze, vinte dias bebendo diariamente, até ficar totalmente debilitado e parava de beber somente quando adoecia por falta de alimentação. Conseguia sobreviver a crise de abstinência, no entanto, depois de alguns dias lá estava ele de novo alcoolizado por dias, semanas. Assim, foi consecutivamente.

Maria, após vários tratamentos e vivendo separada conseguiu ter seu quadro de saúde melhorado, mas nunca mais se recuperou totalmente, vivia a base de medicamentos mentais os quais mantinha lúcida. Infelizmente, o quadro mental de Maria somente pode estacionar nestas condições, porque o casal manteve separado.

Devido o ocasionado na separação do casal e a atitude dos avós maternos terem abandonado os netos, isto criou certa revolta dos netos com estes avós e, como foram anos nesta situação Maria mesmo querendo assumir os filhos novamente acabou encontrando resistências. Somente com o passar dos anos os filhos aproximaram de sua mãe passando a tratá-la com carinho e atenção, mas, muitas desta aproximações dos filhos com a mãe causava em Ana Maria – mãe de Jose – ciúmes e assim, sempre quando os filhos aproximavam de sua mãe havia muitas discussões entre os netos e a avó.

Os filhos do casal já adultos, empregados – ainda solteiros – ampararam sua avó juntamente com seu pai já que ela foi aquela que no momento mais difícil esteve sempre ao lado deles, os assumido desde suas infâncias.

Maria e José ainda que se gostasse mutuamente não conseguiram mais se unir, cada um vivia o amor de um pelo outro apenas no sentimento. Era comum a preocupação de Maria com o alcoolismo de Jose, porem, não tinha o que fazer. Embora a vontade do casal fosse a reconciliação José não conseguiu vencer o alcoolismo até que determinado dia numa rodovia depois de estar embriagado deitou debaixo de uma arvore para dormir chegando ao óbito por meio de um enfarto.

Três anos após a morte de Jose, Ana - sua mãe - já com idade bem avançada, somando-se todo o sofrimento de uma mãe ver um filho no álcool veio a falecer. Com a morte de Ana, houve a aproximação definitiva de Maria com seus filhos, até que, depois de 7 anos da morte de Jose ela também faleceu através de um enfarto fulminante. Desta maneira findou-se mais uma história de um casal que muito se amou, porém o álcool foi o divisor que destruiu esta família. No entanto, de toda esta triste realidade os filhos conseguiram sair sãos e ilesos, apenas com a triste história que marcará para sempre suas vidas.

domingo, 15 de novembro de 2009

ALCOOLISMO NA SOCIEDADE !!


Meu filho de 16 anos tem problemas com a bebida. Ele constantemente chega bêbado em casa e sua atitude geralmente é agressiva. Já conversei com ele sobre o assunto, mas ele me disse que não consegue parar de beber. Existe algum meio de me livrar deste problema? O Estado pode me ajudar a enfrentá-lo? O que eu devo fazer?

O álcool está presente em diversas culturas e participa do cotidiano da humanidade desde ritos religiosos até o simples uso comemorativo. Consumido desde a Antiguidade, é uma das substâncias que mais causa danos à saúde, podendo até levar o indivíduo ao óbito.

O problema do alcoolismo afeta milhares de pessoas no mundo. Durante anos, esta questão foi vista como um problema de ordem meramente policial. Porém, com o tempo, a sociedade passou a entendê-lo como um problema de saúde pública. Hoje, a grande preocupação é de se conscientizar as pessoas que sofrem deste mal a procurarem ajuda nos postos e serviços da rede pública de saúde para tratamento médico e psicológico.

A bebida alcoólica tem um grau de aceitação social muito grande em nosso país. Apesar de causar dependência, é objeto sempre presente em eventos, comemorações, festas, datas especiais. É tido como sinônimo de progresso, vitória, conquista, felicidade. Em muitos casos, seu uso é estimulado por parentes, amigos e pessoas próximas do convívio social. Essa aceitação demasiada esconde um lado perigoso e legitima o seu consumo indiscriminado.

Contudo, ao mesmo tempo em que a sociedade aceita o consumo de álcool como algo normal, ela reprime aquele que sofre as consequências da dependência alcoólica, o alcoólatra. Este é, por muitas vezes, visto como um indivíduo fraco, imoral e irresponsável. Passa por problemas que vão desde as relações familiares a constrangimentos e críticas no ambiente de trabalho. Um paradoxo social covarde que reflete a ignorância da comunidade em relação à doença.

Os danos que o consumo excessivo de bebidas alcoólicas pode acarretar são muitas vezes irreparáveis. Por diversas vezes é causa de discussões, violência no trânsito, violência doméstica, doenças, perda de emprego, entre outros. Devido a tais fatores, o Estado regula condutas e impõe leis que dizem respeito à taxação de preço das bebidas alcoólicas, idade mínima para compra de álcool, limitação das horas de compra e funcionamento de bares, proibição total ou parcial de propaganda de bebidas alcoólicas e punições para quem dirige embriagado.

Expansão do consumo de álcool entre os adolescentes

O consumo de álcool é mais difundido na nossa sociedade através de propagandas, marketing e publicidade. A indústria do álcool vem atingindo um público mais jovem e conseqüentemente desencadeando problemas aos consumidores cada vez mais cedo.

A falta de prevenção, o excesso de publicidade, o desconhecimento dos efeitos do álcool, a facilidade de acesso e os baixos preços cobrados na venda de bebidas alcoólicas trazem adversidades e transformam os jovens num grupo bastante suscetível aos malefícios causados pelo álcool. Aumento da agressividade, alteração comportamental, e no caso das mulheres em período de gestação, grande tendência à formação defeituosa do feto são alguns dos fatores que os jovens estão sujeitos a enfrentar.

Diante da diversidade de riscos que correm e do reconhecimento de que esses indivíduos merecem atenção e defesa especial visando o pleno desenvolvimento de sua personalidade, foi criada em 1990 a Lei nº 8.069/90 que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O Estatuto tem por objetivo a proteção integral à criança e ao adolescente, observando suas fragilidades e necessidades.

Em se tratando de álcool, o ECA dispõe em seu art. 81, inciso II, que é proibida a venda de bebidas alcoólicas e de produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica, ainda que por utilização indevida, à criança e ao adolescente. Define, ainda, no art. 243, como criminosa a conduta de quem vende, fornece, ministra ou entrega, de qualquer forma, à criança ou adolescente, sem justa causa, produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica, ainda que por utilização indevida. A sanção para este crime é de seis meses a dois anos de detenção, além de multa.

Enfrentando o alcoolismo

O maior problema na batalha contra o alcoolismo é o não reconhecimento do indivíduo quanto à sua condição de alcoólatra. O forte preconceito social e a defesa de sua auto-estima fazem com que o alcoólatra não se disponha a enfrentar o problema. Principalmente nos estágios iniciais da doença, os limites entre a dependência e o uso social não são muito claros, dificultando os diagnósticos e facilitando a rejeição da pessoa quanto ao seu estado. Esse atraso na luta contra a doença geralmente traz prejuízos para a pessoa, pois o processo para a reversão fica dificultado.

O alcoolismo atinge hoje uma parte considerável da população do Distrito Federal. Segundo dados da Secretaria de Saúde, mais de 150 mil pessoas no DF sofrem do problema, sendo 15% da população de homens e 1% da de mulheres. No entanto, o crescimento da doença entre as mulheres é fator de grande preocupação já que os efeitos destrutivos do álcool se manifestam com maior amplitude no organismo feminino devido a sua maior sujeição à absorção de álcool.

No combate ao alcoolismo, no âmbito do governo do DF, foi aprovada em 1996 a Lei nº 1212/96 criando o Programa Integrado de Apoio ao Servidor Dependente de Álcool e Outras Drogas - PROSERVIDEP. O programa tem seus objetivos dispostos no art. 4º da citada lei. Entre eles está a criação de núcleos de atendimento aos dependentes em todos os órgãos do Governo do Distrito Federal. Trata-se de uma chance para o servidor ter um primeiro contato com profissionais especializados na prevenção ao alcoolismo.

O tratamento aos dependentes do álcool é feito pela rede pública de saúde. Além do processo de desintoxicação prestado pelos hospitais públicos, são oferecidos serviços de assistência social e psicológica através do Centro de Atenção Psicossocial (Caps). Os Caps são instituições de atendimento comunitário que visam o bem estar da saúde mental dos pacientes por meio do trabalho de psicólogos, terapeutas, enfermeiros, clínicos e outros profissionais. Hoje o DF conta com sete unidades distribuídas pelas diversas regiões administrativas.

Em se tratando de álcool, existem três centros especializados. Localizados no Guará e em Sobradinho, respectivamente, o Caps AD (Álcool e Droga) e o Caps AD2 são voltados para o atendimento aos adultos. Já aos adolescentes, o Caps I AD funciona no Adolescentro, localizado na Asa Sul (Quadra 605). Uma boa oportunidade para quem procura um tratamento contra o alcoolismo, já que os serviços são gratuitos. Mais informações a respeito dos Caps podem ser obtidas no telefone 34032415.

Reconhecido como um problema de saúde pública, o alcoolismo vem sendo combatido com medidas políticas e jurídicas. Um avanço na luta contra a doença, causada por um objeto de consumo muitas vezes tratado com certa tolerância e proteção, mas que, no entanto, é semente de graves problemas sociais.

Textos elaborados pelo estagiário Guilherme Sivieri

O projeto O Direito Achado na Rua é desenvolvido na Universidade de Brasília sob a direção do professor José Geraldo de Sousa Júnior e do professor Alexandre Bernardino Costa, da Faculdade de Direito // As respostas são elaboradas pelos orientadores e estagiários do Núcleo de Prática Jurídica da UnB, sob a supervisão do professor/advogado Mamede Said Maia Filho // Perguntas devem ser dirigidas para o endereço eletrônico npj@unb.br ou Núcleo de Prática Jurídica da UnB, CNN 01, bloco E, sobreloja – CEP 72.225-500 – Ceilândia-DF
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quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Álcool mata. Mas quem se importa?

A Lei Seca parectar pegando, as políticas públicas vêm evoluindo, o preconceito diminuiu. O alcoolismo vem sendo mais bem compreendido nos últimos 20 anos. Mas a maioria dos brasileiros ainda não acredita que a dependência do álcool seja doença – nem que o único remédio para o dependente, muitas vezes, seja parar de beber. Foi o que fez o jornalista e escritor Ruy Castro, ex-marido da autora do texto, há 21 anos – e ele não tem do que reclamar. Foi essa também a escolha do médico que o ajudou na época e de algumas pessoas que resolveram contar suas histórias. Todas elas só têm motivos para comemorar – sem álcool. E desejam que muitos outros brasileiros aprendam a lidar com essa doença tão social e tão traiçoeira

Alice Sampaio

Quando saiu a Lei Seca, em junho de 2008, pipocaram reportagens abordando esquemas alternativos criados por donos de bares (mandar o cliente para casa de táxi ou de van) e pelos frequentadores (fazer rodízio para ter um motorista sóbrio), ao lado de protestos de inconstitucionalidade e outros. Mas o que levou as autoridades a determinar a prisão de quem dirigisse depois de consumir apenas dois chopes? Afinal, as pessoas abusam tanto assim da bebida?

O álcool é a droga mais consumida no mundo, e dirigir alcoolizado é um dos nossos principais problemas de saúde pública. O I Levantamento Nacional sobre os Padrões de Consumo de Álcool na População Brasileira, realizado em 2007, acusou: dois terços dos indivíduos que dirigiram alcoolizados fizeram isso depois de consumir três doses de álcool duas a três vezes no último ano - ou seja, a maioria bebeu mais do que o limite legal do Brasil antes da Lei Seca. E 61% da bebida consumida era justamente cerveja ou chope. Os números são claros: segundo dados do Ministério da Saúde de março de 2009, os atendimentos de urgência caíram em média 11,5% em 17 das 26 capitais pesquisadas, e houve uma redução de 20,5% no número de vítimas fatais em acidentes de trânsito. E o balanço anual divulgado pela Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) também em março revelou que as mortes em acidentes no trânsito paulistano diminuíram 6% em 2008 - com apenas seis meses da lei mais rigorosa.

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Alcoólatra eu?...imagine
Alcoolismo e perda da liberdade

Realizado pela Secretaria Nacional Antidrogas (Senad) em parceria com a Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas (Uniad) do Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), o I Levantamento Nacional foi coordenado pelo médico psiquiatra Ronaldo Laranjeira e revelou uma realidade infinitamente mais dramática: temos aproximadamente 12% de alcoólatras - cerca de 15 milhões de pessoas! Da população pesquisada, com idade de 14 a 65 anos, 52% bebe: metade ocasionalmente, e metade, com frequência. Dos que bebem com frequência, metade é dependente e os outros 12% são bebedores abusivos. Beber abusivamente, ou de maneira nociva, significa consumir cinco ou mais doses uma ou mais vezes por semana (no caso das mulheres, quatro doses ou mais). Esse levantamento e outros estudos recentes indicam também que os jovens estão começando a beber por volta dos 12 anos. Na região Sul, o quadro é pior. Reportagem publicada em 2008 no jornal
Zero Hora, sob o título "Infância assolada pelo álcool", alertava que os hábitos culturais da serra gaúcha fazem crianças de apenas cinco anos começarem a beber vinho por influência dos familiares.


Pesquisas sobre violência doméstica jogam mais combustível nesse copo: uma delas, realizada em 2007 pelo DataSenado, registrou o uso de álcool em 45,5% dos casos de violência doméstica. Esse dado confirma pesquisa de 2005 do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid), que relatava agressores alcoolizados em 52% dos casos.

O álcool, usado pelas pessoas para ficarem "alegres", pode se tornar uma arma, especialmente nas mãos de quem se torna seu escravo. As coisas melhoraram muito nas duas últimas décadas, pois os mitos que cercavam a dependência química começaram a cair graças à atenção da mídia. "Hoje existem políticas públicas continuadas", diz o dr. Luiz Alberto Chaves de Oliveira, mais conhecido como dr. Laco, que é presidente do Conselho Municipal de Políticas Públicas sobre Drogas e Álcool (Comuda) e também Coordenador de Atenção às Drogas na cidade de São Paulo. "As universidades se preocuparam em formar profissionais especialistas na área, o que não existia nos anos 1980, e surgiram outros modelos de tratamento além da internação. Mas os grupos de ajuda mútua, espalhados por todo o País, ainda sofrem muito preconceito e são desconsiderados", afirma o médico, que garante que existe uma relação direta e bastante documentada entre abuso de álcool e diversos tipos de câncer, como de faringe, esôfago, fígado e pâncreas, e ainda com infarto, hipertensão, AVC. "A doença alcoolismo tem um caráter multifacetado", completa.

Para o psiquiatra Ronaldo Laranjeira, da Uniad, muita gente ainda não compreende a doença. Ele explica: "Ninguém nasce dependente do álcool: o alcoolismo é um processo em que a pessoa se torna dependente ao longo dos anos, à medida que bebe cada vez mais - inclusive para aliviar a ressaca. O problema é que é difícil identificar o alcoolista* antes que o quadro se torne severo", diz Laranjeira. Ele entregou em abril de 2008 um abaixo-assinado com 800 mil assinaturas ao presidente da Câmara, em Brasília, solicitando a proibição de anúncios de cerveja na TV e no rádio das 6 às 21 horas. Esse abaixo-assinado foi fruto do movimento Propaganda sem Bebida, encabeçado pelo Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) e pela Uniad/Unifesp. "No mês seguinte o governo mandou uma MP ao Congresso com urgência constitucional", conta o médico. "Mas o
lobby das indústrias de bebidas é fortíssimo: o caráter de urgência foi retirado e a MP ainda não foi votada."

Histórias em comum
Para ajudar mais pessoas a entender a complexidade dessa doença traiçoeira, fantasiada de "costume social", o jornalista e escritor Ruy Castro decidiu contar pela primeira vez os problemas que o álcool - que abandonou há 21 anos - trouxe à sua vida no passado.

Ruy já bebia bastante aos 19 anos, quando conseguiu um bom emprego em uma revista e deixou a família para morar sozinho no lendário Solar da Fossa, no Rio, habitado por artistas, jornalistas e boêmios. Foi quando começou a beber "profissionalmente", de forma constante e crescente. "Eu bebia feito gente grande e não tinha ressaca", conta Ruy. "Comprava litros de
scotch e também bebia bastante na casa dos outros, pois havia uma cultura do uísque naquela época - havia quem o comprasse em galões, daqueles com torneirinha, não garrafas."

De 1967 a 1976, Ruy calcula que tenha bebido um litro de uísque por dia - no mínimo. Depois de uma fase encharcada por aquavit (uma aguardente escandinava), ao se mudar para São Paulo, em 1979, voltou ao uísque. Mas logo se converteu à vodca com gelo: "Se continuasse bebendo uísque escocês naquela quantidade, iria à falência. E o uísque nacional era ruim, não dava para tomar. Mas a vodca era boa. Além disso, pelo fato de não ter gosto, era menos enjoativa para quem bebia em grandes quantidades. O problema é que ela também deixa cheiro, ao contrário do que muito bebum pensa...".

Ruy bebia horrores, mas dificilmente ficava bêbado. "Foram tão poucas vezes que até me lembro delas. A pior foi quando fui totalmente de porre ver um show do cantor americano Bobby Short no Maksoud Plaza", rememora ele. "Até caí na garagem, na saída! Mas meus porres eram bem esporádicos. Uma vez, fui entrevistar a turma da jovem guarda (que tentava um dos seus vários revivals) e já cheguei mal ao teatro. Não dava nem para começar. Felizmente, tive a consciência de voltar para casa e telefonar para o jornal, inventando uma desculpa. Só fiz a entrevista no dia seguinte."

Foi nessa fase - metade de 1984, quando começamos a namorar - que o álcool começou a interferir negativamente no seu comportamento social e profissional. Um ano depois fomos morar juntos, e uma amiga nos deu, como presente de casamento, uma dúzia de garrafas de vodca - que ele enxugou em menos de 15 dias. E ainda tentou disfarçar, colocando parte da culpa na empregada - uma atitude comum em alcoólatras não assumidos. A partir daí, passei a prestar mais atenção e a perceber a rapidez com que as garrafas eram esvaziadas. Ainda não achava que ele era alcoólatra, mas começava a desconfiar que aquele jeito de beber não podia ser normal.

Em 1987, com o massacre sobre o organismo, Ruy finalmente começou a ficar alterado com certa frequência. Comecei a buscar informações sobre o alcoolismo e me convenci de que ele precisava mesmo de ajuda. Em agosto, numa festa, encontrei um amigo médico que tinha parado de beber um mês antes. Conversamos muito naquela noite e também depois, na casa do dr. Laco (personagem importante nessa história, como será visto adiante). Mais bem informada, comecei a "fazer campanha" para Ruy se internar. Estava assustada, pois ele já apresentava sintomas da fase mais avançada do alcoolismo: não tomava café da manhã, não se alimentava, estava anêmico e não se cuidava. E eu estava solitária nessa batalha - ninguém acreditava que fosse necessário interná-lo. Como sempre, as pessoas achavam apenas que Ruy não tinha problemas, era apenas "um bom copo". E era mesmo: no alcoolismo, as pessoas não precisam de problemas para beber. Mas, no que bebiam, os problemas iam surgindo uns atrás dos outros.

Por sorte, ele aceitou meus argumentos. Numa segunda-feira de manhã, 25 de janeiro de 1988, fomos para o Recanto Maria Tereza, clínica especializada em dependência química, em Cotia, a 30 quilômetros de São Paulo. Antes de sairmos, Ruy bebeu três doses de vodca, para "calibrar" a tremedeira das mãos. Porém, quando estávamos a três quilômetros da clínica, deve ter se assustado com a perspectiva de ficar longe da garrafa, porque pediu que voltássemos e deixássemos aquilo para outro dia. Acelerei e segui em frente, argumentando que já estávamos bem perto, não valia a pena voltar. E, afinal, ele havia prometido. Na recepção, fez brincadeiras com a enfermeira que me envergonharam. Mas eu sabia que nada era mais importante do que conseguir que ele se internasse. Acreditava que ele deixaria de beber assim que entendesse o estrago que estava fazendo na sua vida. Naquele dia, Ruy se internou por três semanas.

Dias depois, cheguei à clínica para visitá-lo pela primeira vez e encontrei-o de mala pronta. Ia embora da clínica! Atordoada, corri aos médicos e perguntei se ele podia abandonar o tratamento. Eles responderam que, devido aos medicamentos e também à fase da desintoxicação em que se encontrava, se saísse e bebesse Ruy poderia até morrer. Mas duvidavam de que ele tivesse forças para fugir. E, de fato, ele não conseguiu. Naquele primeiro fim de semana, ainda parecia um pouco confuso - sentava-se e se levantava com dificuldade e não conseguia manter uma linha reta ao andar. Mas os médicos garantiram que em poucos dias ele ficaria bem.

Foram três semanas difíceis. Nos fins de semana, eu própria ouvia palestras e participava de terapias de grupo na clínica, que me ajudaram bastante. Mas nem tudo se acomodou na memória dele exatamente como na minha. Descobri isso apenas quando o entrevistei longamente em fevereiro passado, pois Ruy me garantiu que tentou trabalhar na clínica e não conseguiu. Primeiro, porque passou dois a três dias "tremendo mais que uma coqueteleira", e, depois, porque lá não era lugar para trabalhar.

"A partir da metade do tratamento, quando recuperei a consciência, me apaixonei pelas palestras", ele conta. "Era um vendaval de informações que me explicavam por que, a cada dia, eu precisava beber mais e mais cedo, por que não conseguia passar meia hora longe do copo e sobre os efeitos do álcool no organismo. Entendi as desculpas que eu próprio me dava para beber. E o que mais me surpreendeu foi descobrir que minha vida, que eu achava tão original, não passava de um grande clichê - porque todos os bebuns se comportam da mesma forma. Entendi que precisava passar a viver pela minha razão, não pela razão do álcool."

Na verdade, a clínica acabou disponibilizando uma sala, onde ele colocou sua máquina de escrever e trabalhou todas as noites (exceto as primeiras), e também após o almoço - hora em que os internos viam tevê. Eu mesma me espantei quando ele trouxe para casa quase 50 laudas datilografadas com o esboço de um livro que se chamaria
Saudades do Século 20. Qualquer médico ou interno daquela época pode corroborar que Ruy trabalhou durante sua internação. Mas ele não se lembra disso e acredita que jogou fora esse original. Deve ter jogado mesmo, pois um livro com o mesmo título acabou sendo lançado em 1994, mas não tinha quase nada a ver com o que ele escreveu na clínica.

Os especialistas explicam que o alcoólatra não esquece tudo o que fazia quando bebia, mas confunde bastante os acontecimentos - especialmente os da última fase. Ruy não foi exceção à regra. A primeira coisa que fez ao chegar em casa foi sentar à máquina e recomeçar a tradução de
O Livro dos Insultos (de H. L. Mencken) do ponto em que tinha parado - o livro saiu meses depois, em junho de 1988. Voltou também a escrever para a Folha Ilustrada, Playboy e muitos outros veículos. Com a cabeça limpa e enorme disposição física, trabalhava cerca de 15 horas por dia, de segunda a segunda. Logo foi convidado a colaborar com o Caderno 2, do jornal O Estado de S. Paulo, ganhando bem mais. Ele mesmo conta: "Um dia fui ao Rio entrevistar o Tom Jobim para a Playboy e trouxe tanto material que tive a idéia de fazer o Chega de Saudade, a história da bossa nova, que saiu em novembro de 1990. Eu nem sonhava fazer livros, antes". Esse é outro exemplo da distorção de memória produzida pelo álcool: antes da internação, Ruy não apenas sonhava fazer livros como tinha idéias maravilhosas - que apenas não conseguia pôr em prática.

Ele ainda lançou, em dezembro de 1989, uma seleção de frases que ganhou o título de
O Melhor do Mau Humor. Ou seja: ao parar de beber, Ruy produziu três livros em dois anos e meio, além de incontáveis artigos para jornais e revistas. "Deixei de beber", diz ele, "mas, com tanta atividade, nunca senti que tinham me tirado alguma coisa. Muitos alcoólatras ficam mal ao parar de beber, porque sentem que lhes roubaram algo muito importante. Nem todos têm paciência para esperar sua vida se reorganizar. E aí voltam a beber e pioram rapidamente se não forem internados de novo. Outros têm vergonha de que as pessoas saibam que eles foram internados e não imaginam que as pessoas ficam felizes quando sabem que um amigo resolveu se tratar".

No trabalho, tudo ia cada vez melhor, mas em casa, não. Comecei a achar que estava casada com um perfeito desconhecido. Na verdade, eu também estava doente - como a maioria das esposas de alcoólatras - e precisava de ajuda. Mas não sabia. As famílias dos alcoólatras frequentemente "adoecem" junto com eles e muitas vezes se desintegram. Em vez de fazer uma terapia tradicional, como fiz, devia ter procurado um especialista em dependência química. Só assim aprenderia que todo alcoólatra muda de personalidade por um bom tempo depois que deixa de beber; que uma boa parte deles vira
workaholic e não consegue dar atenção à família nos primeiros tempos; e que o familiar do alcoólatra precisa de ajuda para sair da codependência; e também para entender as mudanças do alcoólatra abstinente. É bastante comum os alcoólatras, quando não perdem a mulher antes de se tratar, perderem depois. Foi o que aconteceu conosco: o alcoolismo dele não foi o único culpado pela nossa separação, mas foi o principal.

Nesses 21 anos, Ruy tornou-se um escritor respeitado, autor de dezenas de livros. Eu me sinto bastante recompensada por isso - apostava na inteligência dele e apostei certo, porque ele nunca mais bebeu. Depois de alguns anos da separação, nos tornamos amigos. "Fui privilegiado porque Alice acreditou em mim", diz Ruy, hoje. "Mas o fato é que os outros internos tinham a mesma história que eu. Havia lá um fazendeiro muito inteligente, um diretor teatral, um executivo de multinacional e outros mais simples. Mas todos tinham sido derrotados pelo mesmo inimigo. E ainda éramos prepotentes, pois achávamos que podíamos parar de beber na hora que quiséssemos! A internação foi uma oportunidade para eu ver que estava destruindo minha vida, e para reconstruí-la."

Outros internos daquela época também pararam por algum tempo, mas alguns voltaram a beber e morreram. Porém, o que impressionou a equipe do Recanto Maria Tereza foi a rapidez com que consegui interná-lo. Levei apenas seis meses, quando a média, segundo os médicos, era de oito anos. Um deles me perguntou como eu havia conseguido. Expliquei que tinha blefado, convencendo-o de que ele só ia fazer uma desintoxicação, mas que fizera isso porque, no fundo, tinha medo de que Ruy morresse em dois ou três anos. O médico garantiu: "Do jeito que ele chegou aqui, só teria mais um ano de vida".

Nunca esqueci essa frase, nem o rosto do médico - ele mesmo um alcoólatra em abstinência, como todos os que trabalhavam no Recanto.

Essa frase voltou a martelar minha cabeça agora, quando vivi outro drama com um parente muito próximo, que já consegui internar, há quatro anos, mas recaiu há oito meses e preocupou toda a família. Quando me vi novamente no palco desse drama - e com pouca plateia -, pedi a Ruy que finalmente contássemos nossa história.

Nos últimos meses, tenho me lembrado do pesadelo que foram as duas internações; do ceticismo dos amigos e familiares, que não entendiam que era a única forma de salvar a vida deles naquele momento; das histórias que ouvi na clínica; dos rostos angustiados dos familiares; e, principalmente, tenho recordado que todas as histórias são sempre muito parecidas. Mas o final só é feliz quando o familiar do alcoólatra consegue convencê-lo a se tratar.

ALCOOLISMO E SAÚDE PÚBLICA
O mais grave problema de saúde pública no Brasil atualmente é o consumo de álcool. Ele determina mais de 10% das mortes ocorridas no País. Embora sejam necessários estudos mais abrangentes e específicos, as evidências disponíveis colocam como prioritárias as políticas públicas que intervenham no controle social da bebida.
Países como Grã-Bretanha e Estados Unidos já estão colocando em prática algumas dessas políticas e alguns estudos ao redor do mundo indicam os caminhos mais promissores para o combate do consumo de bebidas alcoólicas.
Por causa da violência, a Grã-Bretanha criou, em 2000, políticas públicas que levaram mais de 200 mil pessoas a tratamento somente em 2007/2008 - e o tratamento funcionou para mais de 75% dos dependentes.
Nos EUA, a elevação da idade mínima dos 18 anos para 21 anos para a compra de bebida alcoólica reduziu em 11% a 16% a ocorrência de acidentes automobilísticos noturnos envolvendo jovens, independentemente da gravidade.
Estudos comparando 17 países com proibição total, proibição parcial ou sem qualquer proibição da propaganda de bebidas alcoólicas mostraram que países que proíbem a publicidade de destilados, cervejas e vinhos têm níveis de consumo 11% mais baixos e 23% menos acidentes automobilísticos fatais do que os países que proíbem apenas a propaganda de destilados.
Restringir dias e horários de venda inibe as oportunidades para compra e pode reduzir o consumo. Estudos conduzidos em diversos países (desenvolvidos e em desenvolvimento) indicam que tais restrições reduzem os problemas relacionados ao álcool.
Fonte: Revista Brasileira de Psiquiatria, volume 26, suplemento 1, maio de 2004


Os familiares de Ernani (nome fictício) sabem disso: foram os irmãos dele e seu filho mais velho que o convenceram a se tratar. Ele parou de beber há quase nove anos e não titubeou para contar sua história - apenas pediu para ficar no anonimato, como consagra o grupo de ajuda mútua Alcoólicos Anônimos (AA) que ele frequenta. Coordenador de pós-graduação de uma universidade federal no Rio de Janeiro, Ernani começou a beber aos 15 anos, e a partir dos 36 perdeu o controle sobre a bebida. Aos 45, logo depois de nascer o terceiro filho, separou-se da esposa - a quem amava. Continuou negando que tinha problemas com a bebida até os 56 anos. Caía na sarjeta, literalmente, e era proibido de beber em diversos bares próximos de casa. Sua irmã começou a frequentar o grupo Al-Anon, destinado aos familiares dos alcoólatras, para poder entender e conviver com o irmão (hoje ela coordena um grupo).

No final, Ernani sentia-se profundamente triste, solitário e insatisfeito profissionalmente, e chegou a pensar em suicídio. "No dia 2 de junho de 2000", relembra, "senti que estava no fundo do poço. Era um dia chuvoso e liguei para o meu filho mais velho, pedindo que me internassem antes que eu mudasse de idéia". Ernani passou 30 dias na clínica Vila Serena, graças ao seguro-saúde do irmão. Só lá ele conseguiu entender quanto sofrimento causara à família e o quanto a doença afetara seu trabalho. Hoje, aos 65 anos, descobre-se
workaholic, sente-se remoçado e reconstruiu sua vida afetiva, tendo casado há um ano. Recentemente, um colega o agrediu gratuitamente por seu passado alcoólico: o resultado foi que os outros professores fizeram um abaixo-assinado e conseguiram a demissão do agressor. Ernani foi pela última vez a uma reunião do AA em dezembro. "Quando saí da clínica, ia duas vezes por dia às reuniões; um ano depois, minha frequência caiu para três vezes por semana; em 2008, fui quatro vezes. Só vou quando preciso, quando me sinto fragilizado. A cura dessa doença é uma pílula imaginária chamada 'não': um remédio abstrato porém real, pois o que funciona mesmo é não tomar o primeiro gole."

Outro adepto desse remédio foi o dr. Laco, 65 anos, que também nunca havia tornado pública sua história. Laco tomou o primeiro porre aos 12 anos, bebendo quentão numa festa junina, e aos 15 já se revelava um bom copo. Formado pediatra pela Universidade de São Paulo (USP), casou, teve um filho e separou. Aos 36 casou com Mary, uma psicóloga. O casal tinha vários conflitos porque ela tentava fazê-lo beber menos. "Eu já sabia que era alcoólatra", conta Laco. "Falava que ia morrer de cirrose ou de acidente. Mas não admitia que ninguém falasse isso para mim, virava uma fera. Isso é típico da negação do problema," afirma.

Aos 41 anos, Laco entrou em depressão. "Eu mal conseguia conversar com as pessoas. Procurei ajuda com um professor universitário, psiquiatra, com tese em alcoolismo - ele disse que ia tratar só da depressão. Eu tomava dois a três uísques e ia para a terapia. Se exagerasse nas doses, telefonava avisando que não ia. Depois de um tempo, eu me dei alta." Segundo Laco, essa atitude também é clássica. Ele melhorou da depressão e bebeu mais dois anos, passando por períodos em que bebia mais, ou menos, ou até interrompia.

Mary começou a frequentar um grupo de Al-Anon e aprendeu como lidar com o marido. "Em vez de discutir minhas bebedeiras, ela me levava livros para ler. Inventou que tinha feito um curso e começou a juntar no quintal as garrafas de uísque, vodca e vinho consumidas, dizendo que ia fazer lustres, copos e outros objetos com elas. Aquele monte de garrafas começou a mexer comigo." Em julho de 1987, Mary viajou com a filha e Laco perdeu um dos dois empregos que tinha além do consultório. Com tempo livre, bebeu ainda mais. Quando ela voltou, ele resolveu se tratar: Mary marcou consulta com Jorge Figueiredo, na época diretor do Recanto Maria Tereza, e Laco internou-se nessa clínica logo depois do Dia dos Pais. Em janeiro de 1988, já fazia parte do seu corpo clínico.

Laco continuou se dividindo entre o trabalho na clínica e no seu consultório, onde atendia alternadamente bebês saudáveis e adultos alcoólatras, até 1990, quando se tornou diretor do Recanto e largou a pediatria de vez. Permaneceu no Recanto até 2005; de 2006 a 2009 trabalhou na clínica Vitória, publicou os livros
Drogas no Ambiente de Trabalho e Drogas? Onde obter ajuda e orientação, e lutou dez anos para criar a Coordenadoria de Atenção às Drogas da Prefeitura, que comanda desde 2008. Fez de sua própria história uma bandeira na luta para ampliar políticas públicas. "Há 22 anos não havia praticamente nada e hoje existe a Política Nacional sobre Drogas (PNAD). A sociedade começa a encarar o alcoolismo como doença. Mas, como existem cerca de 15 milhões de alcoólatras e cada um tem família, podemos dizer que pelo menos 45 milhões de brasileiros são diretamente afetados pelo alcoolismo. Pessoas que recebem um impacto social, emocional e econômico direto, e necessitam de atenção."

O consume de álcool no mundo
Por motivos culturais, alguns países não consomem bebidas alcoólicas É o caso do Irã e do Iraque, onde 73,4% e 89% da população, respectivamente, não bebem. Mas não é só no mundo islâmico que a bebida é usada com moderação:
na Índia apenas 20,9% da população bebe. Mas o consumo é bastante grande em outros países. Saiba onde mais se bebe no mundo.

Fonte: The Global Status Report on Alcohol 2004, Organização Mundial de Saúde
PaísesConsomem álcool (pop. adulta)Bebem abusivamenteSão dependentesCustos sociaisGastos com álcoool
Alemanha94,9%22,5%7,5%13% das mortes em acidentes de trânsito26,5 bilhões de dólares
França93,3%24,4%17,4%De 13% a 20% das internações hospitalares, 30% dos casos de violência doméstica e 1/3 das mortes em acidentes nas estradas31 bilhões de dólares

Grã-bretanha

88%22,6%9,6%Mais de 150 mil internações hospitalares, 1/3 de todos os atendimentos de emergência e uma em cada sete mortes no trânsito25,4 bilhões de dólares
Itália75%11,8%2,5%De 30% a 50% das mortes em acidentes nas estradas, 20% das hospitalizações de emergência9 bilhões de dólares
Dinamarca97%23,5%De 3% a 4,3%4,6% do total de mortes, 26,6% das mortes em acidentes de trânsito e 41% das mortes em acidentes nas estradas.Dados não relatados
Holanda84,2%20,1%10,9%9,8% das mortes em acidentes de trânsito3,3 bilhões de dólares
Finlândia92,6%9,2%8%14,6% das mortes ou ferimentos em acidentes nas estradas e 35% dos que cometeram suicídioDados não relatados
Estados Unidos66,1%11,4%15,9%28,7% das internações, 41% das mortes nas estradas, 12,5% dos agressores sexuais184,6 bilhões de dólares
Japão86,5%27,6%9,1%Quase 50% das mortes em acidentes de trânsito, 12,1% das mortes violentas no país5,7 bilhões de dólares

Brasil

77,2%4,6%22,8%*20% das hospitalizações por problemas mentais são relacionadas ao uso de álcool e outras drogas, 18,8% dos adolescentes que tentam o suicídio estão alcoolizados.Dados não relatados
*Dado pesquisado somente nas grandes capitais

É importante esclarecer que um alcoólatra não precisa obrigatoriamente ser internado para se tratar: cada caso é um caso e hoje existem outros modelos de tratamento. Mas é preciso alertar que o álcool embriaga a família. "A doença gera ansiedade e desagregação na família, que dificilmente sai do problema sozinha", explica Fátima Rato Padin, psicóloga com especialização e mestrado na Unifesp. Os grupos de ajuda mútua, como Amor Exigente e Al-Anon, segundo Fátima, têm filosofias próprias e não servem para todos. Mas a família não deve desistir porque procurou ajuda e não deu certo. "Ela deve procurar profissionais especializados em dependência química, que vão acolher sua angústia, fortalecê-la e orientá-la, para que ela possa levar o alcoólatra a se tratar", diz Fátima, que salienta que os tratamentos não podem ser iguais porque as pessoas têm graus de dependência diferentes. Fátima coordena o Alamedas, Núcleo de Reabilitação Psicossocial da Uniad, em São Paulo - um serviço ambulatorial de atenção diária iniciado em 2008, que coloca uma equipe composta por psicólogos, médicos, terapeutas ocupacionais, acompanhantes terapêuticos, psicopedagoga e neuropsicóloga trabalhando pela reintegração social do dependente químico. Esse atendimento é realizado conforme a disponibilidade financeira e de horários do paciente.

Para o dr. Laco, do Comuda, a família adoece junto e muitas vezes deixa o alcoólatra chegar ao estágio mais avançado da doença. Os sintomas que indicam que a situação está grave são: tremores nas mãos pela manhã; problemas de memória, concentração e raciocínio; queda de produtividade, dores diversas (como abdominal e muscular); e manchas pelo corpo, que podem evidenciar problemas hepáticos. "É comum o homem falhar sexualmente, ou mesmo ficar impotente temporariamente nessa fase", afirma o dr. Laco. "E quando eles saem da clínica continuam em recuperação e podem ter dificuldades de memória, de concentração e de restabelecimento do convívio social por um bom tempo. Internação é para 10% a 20% dos casos. O que a família precisa entender é que não adianta negar ou minimizar o abuso do álcool que está causando problemas e muito menos acreditar que tudo mudará magicamente, ou que ninguém mais percebe o que está acontecendo."

Romolo Gresta, economista de 62 anos, é um caso raro, pois parou de beber há cinco anos sem qualquer tratamento. Ele consumia uísque, cerveja e cachaça em grandes quantidades desde os 14. Quando seu filho Remo, do segundo casamento, tinha oito anos, deu-lhe um bom motivo para parar e pensar: "Eu moro em Niterói, e o Remo, em Minas", conta Romolo. Ele estava me visitando e eu quis levá-lo a uma lanchonete, mas ele disse que eu tinha bebido muito e ele não queria pagar mico. Respondi que ele nunca mais me veria beber - e cumpri isso a partir do dia seguinte". Romolo sentiu muita falta do uísque nos primeiros meses, mas percebeu também que nunca saía com uma mulher sem beber e jamais viajava sem conhecer todos os bares do lugar. Hoje ele só toma água mineral com gás, gelo e três fatias de limão. "Eu curto muito mais, fico até tonto! Tudo ficou melhor sem álcool, desde o sexo até dormir e comer. Meu filho está orgulhoso e outro dia me liberou para uma cervejinha. Mas eu não sei beber. Tenho certeza que, se tomar uma dose, vou embora..."

*"Nos últimos anos, especialistas vêm adotando os termos alcoolista e alcoólico para substituir a palavra alcoólatra que, segundo eles, carrega em sua etimologia o sentido estigmatizante de "adorador" do álcoole es

sábado, 12 de setembro de 2009

Alcoolismo - Doença da Família


O alcoolismo - doença reconhecida pela Organização Mundial de Saúde (OMS), desde 1967 - afeta seguramente dez por cento da população do mundo, sem poupar sexo, idade, condição sócio-econômica e/ou etnia. Os efeitos desse problema vai bem mais longe do que se pode imaginar, dando margem a uma séria de indagações e reflexões.

Por exemplo: o que têm a ver a família, os amigos, os vizinhos, os colegas de trabalho? Qual o grau de comprometimento, além do sentimento de solidariedade, pelo fato de serem ‘humanos’ e sentirem pesar pela dor do outro? Como e por quê adoecem junto com o alcoólico?! Em que nível, quando e como adoece? Onde está o ‘contágio’?

Estando o alcoólatra inserido numa família, sofrendo as conseqüências que o mal lhe causa, com uma doença física, psíquica, emocional, espiritual e social, é impossível que as pessoas do seu convívio permaneçam ilesas na relação. O contágio do alcoolismo se dá, assim, em nível emocional e psicológico, a princípio, podendo ir às conseqüências físicas mais sérias, como hipertensão, síndrome de pânico, entre outras.

DEPENDÊNCIA

O adoecer da família vai acontecendo à medida que evolui e se instala a dependência propriamente dita, do alcoólatra. É um processo paralelo. É o ambiente familiar - onde o bebedor, o cônjuge, e os filhos convivem e deveriam partilhar em conjunto de todos os acontecimentos (fáceis e difíceis, alegres e tristes, da rotina do dia-a-dia, do crescimento da família, dos filhos) - que mais sofre as conseqüências, a desagregação e o adoecer.

O espaço doméstico passa a ter em comum as dores (físicas e emocionais), a angústia, o medo, a raiva, o ressentimento e os dissabores. Do odor ( mau cheiro) do álcool ao nervosismo dos que se encontram em casa, no lar e não sabem em que condições chegará o familiar alcoólatra; às promessas não cumpridas, os sonhos desfeitos, as noites insones, a ausência total, tudo é sofrimento, é decepção, é a verdadeira ‘dor da alma’ .

Daí, os efeitos do álcool no alcoólatra, no que diz respeito aos distúrbios físicos, psicológicos e sociais, serem ‘socializados’ com os que com ele convivem. Assim como as seqüelas no comportamento, ao longo da vida... Mudança de personalidade, alteração de humor, angústia, depressão... Levando-nos a concluir que, sendo o alcoólatra um dependente químico do álcool, seus familiares, as pessoas de sua convivência, são co-dependentes, por tudo que adquiriam ao longo do processo. O relacionamento tende a se transformar num dilema, num tumulto.

TRATAMENTO

Considerando o alcoólatra como portador de uma doença, assim como os seus familiares pessoas que adoeceram em conseqüência da convivência, entendemos que todos precisam de tratamento e cuidados especiais para levarem uma vida saudável.

Como em qualquer outro diagnóstico, o doente só se trata se admitir que é doente e se quiser se tratar. É a ‘rendição’ à doença e a ‘aceitação’ do tratamento. Não é diferente com o portador do alcoolismo e seus co-dependentes.

Tanto para os alcoólatras como para os familiares, em muitos casos, não basta a consulta com o médico, o tratamento medicamentoso. É preciso algo mais. Nesse momento entra a grande contribuição de Alcoólicos Anônimos - para os alcoólatras - e de Al-Anon para familiares e amigos.

“Os Grupos Familiares Al-Anon são uma associação de parentes e amigos de alcoólicos que compartilham sua experiência, força e esperança, a fim de solucionar os problemas que têm em comum.”

Nesses grupos de ajuda mútua, só existe um propósito: ‘ prestar ajuda a familiares e amigos de alcoólicos’. São grupos abertos, democráticos, onde o que conta é a disposição para mudança interior; mudança de atitude para uma recuperação satisfatória.

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(*) Graça Bezerra é Assistente Social

ARTIGOS DE WALTER MEDEIROS

ALCOOLISMO, UMA DOENÇA SOCIAL

AL-ANON COMO UM RECURSO A MAIS PARA OS PROFISSIONAIS

O REMÉDIO NÃO ERA O ÁLCOOL

BEBIDA ALCOÓLICA PATROCINA A SELEÇÃO BRASILEIRA

ONDE CUIDAR DO DEPENDENTE QUÍMICO

ARTIGOS DO DR. ALBERTO DURINGER

1. Alcoolismo, onde está a doença primária?

2. A recuperação em alcoolismo

3. A tática do avestruz

4. Desarmando os gatilhos

5. Alcoolismo e desempenho sexual

6. Sintomas de recaída

terça-feira, 18 de agosto de 2009

CAUSAS DO ALCOOLISMO

O alcoolismo ou Síndrome de Dependência do Álcool, é hoje uma das doenças com conseqüências físicas e sociais mais danosas, catalogada tanto pela Associação Médica dos Estados Unidos quanto pela Organização Mundial de Saúde. Ela afeta o físico, o emocional, o espiritual, como também a família, amigos, social, financeiro, profissional, ou seja, afeta tudo. É responsável também pelo elevado número de homicídios, suicídios, acidentes de trabalho, de trânsito e um dos campeões de internações e reinternações em clínica e hospitais. Embora trata-se de uma doença pouco divulgada, o alcoolismo precisa ser tratado, porém, a própria pessoa e a família, por preconceito e vergonha, procuram esconder e não buscam auxílio.

As pessoas em geral relacionam o alcoolismo apenas aqueles que bebem compulsivamente todos os dias e em grande quantidade, caindo pelas ruas. Esta imagem até pode ser real, mas é insuficiente para dar conta da extensão da doença, pois a quantidade e a freqüência nem sempre são fatores exclusivos para seu diagnóstico. Há aqueles que dizem beber apenas socialmente, mas já são portadoras da doença, pois são dependentes, muitas vezes sem o saberem.

A principal característica do alcoolismo é que está associado a uma sucessão de perdas. O desejo incontrolável da bebida e a incapacidade de estabelecer um limite para controlá-lo, comprometem os relacionamentos profissionais, familiares e as amizades. O alcoólatra, perde o controle sobre sua vontade, depois o respeito pelos outros, a memória, o raciocínio abstrato, a capacidade de concentração, o trabalho e a família. Muitos chegam a perder-se a si mesmo, quando não a própria vida, seja em acidentes, doenças, assassinatos ou suicídios.

Os alcoólatras arrumam os mais diversos pretextos para o primeiro gole, depois para o segundo e assim por diante, como ressentimentos, raiva, ciúme, cansaço, etc. Alegam que bebem para esquecer ou para adquirir coragem para expressar sentimentos que não conseguem quando sóbrios. De fato, no início, o álcool parece dar a sensação de 'poder' para quem o ingere, mas o preço disso é a rejeição pela sociedade e por si próprio. Embora todas as causas do alcoolismo ainda não tenham sido descobertas, acredita-se que um dos fatores seja a hereditariedade; ou seja, os filhos de pais alcoólatras têm mais predisposição a desenvolver a doença.

Evidentemente, é preciso prestar atenção às causas da dependência física ao álcool, mas também é importante levar em conta as necessidades psicológicas que levam a pessoa a refugiar-se na inconsciência de seus efeitos. Na maior parte dos casos, a doença é contraída durante a adolescência, fase em que se busca aprovação e maior segurança, como uma forma de defesa para sentir-se aceito pelo seu grupo social. Em sua maioria, embora nem todos levem o vício ao extremo na juventude, os alcoólatras começam a beber para se sentirem mais seguros ou engraçados entre os amigos.

Em nossa cultura, tomar uma dose é uma prática associada a alguma comemoração, a momentos bons ou divertidos, e por isso, atrai em especial os adolescentes. Com o tempo, tudo passa a ser motivo para beber, bons ou maus momentos, festas de reencontro ou de despedidas. O alcoólatra julga usar o álcool para resolver seus problemas, sem se dar conta de que multiplica seus desconfortos físicos e emocionais e passa a depender do álcool para tudo, até para esquecer que é dependente. O álcool é usado muitas vezes e inconscientemente para fugir ou suportar uma realidade. De um aliado nas situações de crise, transforma-se em algoz do dependente e a pessoa que, no início achava que se tornava forte, descobre-se absolutamente fragilizada e merecedora do desrespeito alheio. Por isso, em certo estágio avançado, o álcool passa a ser considerado como uma forma de autopunição e autodestruição.

Não existem tratamentos capazes de erradicar totalmente a doença, ou seja, ninguém deixa de ser alcoólatra, mas é possível, contudo, que o doente evite o álcool, interrompendo a sucessão de perdas e recuperando as condições mínimas de convívio familiar, social e profissional. Para isso, é preciso tomar uma decisão nem sempre fácil, decorrente de um processo de conscientização. A decisão é evitar o primeiro gole, seja em que situação for. Para chegar a isso, o alcoólatra precisa adquirir consciência dos males que provoca a pessoas com quem convive e perceber principalmente os males que causa a si próprio. O álcool não compromete apenas aquele que bebe, mas também os que convivem à sua volta.

A primeira condição para libertar-se das conseqüências do alcoolismo é desejar parar de beber, podendo procurar auxílio de organizações como os Alcoólicos Anônimos - AA, em que alcoólatras encorajam-se uns aos outros se manterem sóbrios. O único requisito para se tornar membro da irmandade é o desejo de libertar-se da dependência, evitando o primeiro gole. Se a bebida estiver atrapalhando sua vida, não sinta vergonha: procure ajuda. Mais vergonhoso que procurar ajuda é ser dependente de um produto químico e usá-lo para ferir as pessoas que lhe são mais caras, em especial você!

Rosemeire Zago é psicóloga clínica com abordagem junguiana. Desenvolve o autoconhecimento através de técnicas de relaxamento, interpretação de sonhos, importância das coincidências significativas, mensagens e sinais na vida de cada um. A base de seu trabalho é o resgate da auto-estima, amor-próprio e reencontro com a criança interior. Faz consultoria em empresas, trabalhando as emoções como aumento da produtividade. Elabora e ministra palestras em todo o Brasil. Colaboradora de diversos jornais com artigos de enfoque psicológico.

e-mail:r.zago@uol.com.br
Rosemeire Zago: Tel: (011) 3815-8453

O que é o alcoolismo?

O alcoolismo é uma doença que se manifesta principalmente na maneira incontrolada da vítima a quem normalmente se dá o nome de alcoólatra ou alcoólico. É uma doença progressiva que, se não for detida, torna-se com o passar do tempo mais violenta, afastando suas vítimas do mundo normal e empurrando-as cada vez mais baixo num abismo que só tem duas saídas: a loucura ou a morte prematura. Além do mais, até o momento é considerada é uma doença incurável. Até que a medicina encontre a cura, uma vez que a pessoa se torne alcoólatra, sempre o será. Nem mesmo depois de anos de abstinência poderá voltar a beber normalmente. Se o fizer, logo estará bebendo mais do que nunca.
Requer abstenção total do alcoólatra, e para que não volte a beber parece que requer também uma mudança na personalidade do dente.
Cabe dizer quer não há necessidade de medo da bebida em si. A ciência médica já eliminou a bebida como a “
causa do alcoolismo”. O mundo sabe, porque pode ver a todo o momento que os que bebem moderadamente não desequilibram suas vidas. Já o beber exagerado não dever ser tratado com a mesma indiferença. Mas, de qualquer forma, a doença do alcoolismo não está na garrafa. Está no homem.

Quem é Alcoólatra?

Qualquer pessoa poderá vir a ser alcoólatra. Todo o tipo de gente poderá cair vítima dessa doença que ataca indiscriminadamente parte das pessoas que bebem: homens e mulheres, ricos e pobres, analfabetos e intelectuais, brancos e negros, descrentes e religiosos, jovens e velhos, gente “boa” e gente “ruim”.
Este fato parece sempre surpreender muita gente. Constantemente se ouvem frases como estas:
“Ele não pode ser alcoólatra, veja quanto dinheiro ganha!” Ou então: “Ela não é alcoólatra. Teve uma boa infância, casou-se bem, tem três filhos. Não, Isso não pode ser possível!” Ou, no outro extremo:“Ele bebe de sem-vergonhice. Já não parou tantas vezes?Bebe porque não tem força de vontade ou não quer parar.”
Todas essas frases vêm de suposições erradas e hoje desmentidas, embora sejam mantidas, consciente ou inconscientemente, pela grande maioria da população. Baseiam-se na idéia totalmente falsa de que o alcoólatra é aquele que está caído na sarjeta (mendigos), e que ali não estariam se tivessem “força de vontade”. Essas ficções morrem muito devagar. As pessoas encontram dificuldades em aceitar que também podem ser alcoólatras a esposa ou marido, o presidente do banco, o padre ou pastor, o político famoso ou o próprio psiquiatra que tratou do seu amigo. O fato é que a doença ataca a seres humanos, e não a certos grupos ou classes sociais.
O Alcoólatra e notavelmente sensível. Mas, para ele, esta sensibilidade não é uma característica saudável e construtiva. Em vez de ampliar seus horizontes e aumentar sua capacidade criativa, como a sensibilidade faz em pessoas saudáveis, ela limita os horizontes do alcoólatra, virando-o para dentro, onde escapa do mundo que não o compreende.

·
“Alcoólatra é uma pessoa cuja maneira de beber causa um CONTÍNUO E CRESCENTE conflito em todos os aspectos da sua vida”
A lógica por detrás dessa definição é tão simples como a própria definição. Se o ato de beber trouxesse problemas na vida de uma pessoa normal, ou ela procuraria beber menos, ou desistiria totalmente da bebida. Para o bebedor normal, isto não apresentaria dificuldade alguma.
Porém, se o bebedor for alcoólatra, poderá reconhecer a solução óbvia e, inclusive, estar convencido de que irá diminuir ou desistir. Porém, jamais o fará por muito tempo, porque não o poderá fazer. A própria doença lhe tira a capacidade de controlar-se. Desistirá totalmente da bebida com freqüência, e pensará que isto prova que não é alcoólatra. Mas acabará sempre voltando a beber, provando justamente o contrário. O problema para o alcoólatra não é parar de beber, é não voltar a beber.
Ameaçar um alcoólatra, apelar para o seu bom senso, implorar-lhe a usar sua
“força de vontade” é ridículo, como seria ridículo dizer a um epilético para que deva usar sua força de vontade para evitar futuros ataques.

Como saber se você é ou não Alcoólatra?

Como alerta, este artigo poderá ser útil. Porém, sugere-se muita cautela e paciência, pois é extremamente difícil diagnosticar o alcoolismo. Dizem que é a única doença em que somente o paciente poderá estar certo do diagnóstico. Os próprios membros de Alcoólicos Anônimos sempre aguardam que o alcoólatra se defina. Especialmente porque não adianta tentar convencer um alcoólatra de largar a bebida até que ele mesmo reconheça sua incapacidade perante o álcool.
Se desconfiar que você mesmo(a) possa ser um(a) alcoólatra, existe uma maneira quase infalível de se testar. Não tente parar de beber por certa temporada, pois isso não provará nada. Como já foi mencionado, até os alcoólatras mais avançados conseguem se abster da bebida, às vezes até por tempo considerável.
O teste é o seguinte:

·
Durante pelo menos três meses, tente beber diariamente um número fixo de bebidas alcoólicas que não varie de um dia para o outro e que não seja mais de três. É preciso beber o mesmo número de bebidas todos os dias durante todo o período de teste, digamos, duas bebidas por dia.
·
Não deverá exceder essa quantidade sob hipótese alguma, insto inclui festas, funerais, ganhar na loteria, mortes súbitas na família, promoções ou perda do emprego, encontros com velhos amigos a quem não via a muito tempo etc.. Se permitir uma só exceção, você não passou no teste.
O teste é tão fácil para os não alcoólatras como seria para um alcoólatra fazê-lo com refrigerante. Porém, raramente um alcoólatra o conseguirá fazer, ainda que a bebida escolhida seja apenas duas latinhas de cerveja por dia.

Quais os sintomas do alcoolismo?

FASE INICIAL (Que dura aproximadamente 10 a 15 anos)
Começa bebendo socialmente. Mais tarde bebe habitualmente. Então passa a beber descontroladamente, e faz muitas promessas aos outros e a si mesmo(a):
“Da próxima vez me controlarei.” Engana-se constantemente com as palavras: “Bebo quando quero e paro quando quero.” Começa a mentir, minimizando o número de “tragos” que ingeriu. Bebe antes de ir para uma festa na qual sabe que haverá bebida. Começa a sentir necessidade de beber em horários determinados: Antes das refeições, após o trabalho, durante um evento qualquer, seja um jogo de futebol, uma reunião ou até em um velório. Bebe para aliviar o cansaço: “Foi um dia de morte no escritório.”Bebe para superar seu nervosismo: “Preciso tomar um pouco de coragem.” Bebe para acabar com sua depressão: “Vamos levantar o espírito.” Sãomuitas as desculpas. Experimenta os primeiros “apagamentos” (esquece o que fez durante a bebedeira).

FASE INTERMEDIÁRIA (Que dura aproximadamente 5 anos)
Continuam, em forma agravada, os sintomas iniciais. Mente a toda hora: para esconder o fato de que sua maneira de beber é exagerada; para evitar as críticas; para tentar convencer-se de que domina o álcool; para salvar seu valor ou seu emprego. Passa a beber onde não o conhecem, para que ninguém o fiscalize. Perde a fome e come irregularmente. Costuma chegar em casa “alto”, ou tarde – ou ambos. Bebe por qualquer motivo: Num dia de chuva (para esquentar); num dia de calor (para refrescar); por perder um grande negócio; por ganhar um grande negócio; para esquecer ou para comemorar.
Anda sempre nervoso, agitado e deprimido, e sempre culpando os outros pelo seu estado. Bebe justamente quando não devia como, por exemplo, antes de uma entrevista importante. E começam as paradas, desistindo completamente da bebida por períodos de semanas, meses e até anos. Porém, ao melhorar a situação, acaba sempre voltando à bebida. E, em breve, estará bebendo mais do que nunca.

FASE FINAL (Que termina na loucura, na morte ou no desejo sincero de se recuperar)
Sua vida se tornou intolerável com a bebida, e impossível sem ela. Bebe para viver e vive para beber. Geralmente não se lembra do que aconteceu na noite anterior. As bebedeiras aumentam em freqüência, intensidade e duração. Começam as internações em hospitais e sanatórios,
“para tratar dos nervos”. Ao sair, desintoxicado, entra no primeiro botequim para tomar uma só, e na mesma noite chega em casa totalmente bêbado. Perde o emprego e não consegue outro. Passa a depender totalmente da família que, por ignorância, tenta encobrir o caso, evitando que o alcoólatra sofra asa conseqüências de suas bebedeiras. Com o resultado de que, não tendo motivos para parar, ele segue bebendo. Os amigos o abandonam. Torna-se rebelde e agressivo, sobretudo com as pessoas das quais mais depende. Perde totalmente o sentido de responsabilidade. Em casa, chora facilmente. Mas, no botequim, sob o efeito do álcool, torna-se um verdadeiro professor de todas as disciplinas, e amigo íntimo das maiores autoridades da cidade, do país e do mundo.

As fases progressivas da doença

PORQUE O ALCOÓLATRA BEBE?

Primeira fase
Durante os primeiros anos, a maioria dos alcoólatras (toda a regra tem suas exceções) mostra uma capacidade crescente de beber. Apesar das quantidades que ingere, não gagueja, não perde o equilíbrio, não fica tonto e não tem ressacas. Porém, os “apagamentos” podem começar nesta fase. Os outros não notam, pois o comportamento do alcoólatra é normal. Contudo, no dia seguinte, ele reconhece que certos acontecimentos da noite anterior desapareceram inteiramente de sua consciência, a partir de alguma hora.
Depende do álcool para fazer por ele o que as pessoas normais fazem por si mesmas. Existe uma tendência para beber em fez de enfrentar uma situação. O alcoólatra freqüentemente reconhece que não deve beber numa hora ou num lugar determinado. Porém, não consegue superar a compulsão de tomar “uma só”. E, depois dessa, não tem mais controle. A bebedeira que segue lhe traz sentimentos de incapacidade, de inferioridade, de “não prestar”.

Segunda fase
Bebe mais rápido e em maiores quantidades que os outros, muitas vezes escondido. Começa a sofrer ressacas dolorosas que se distinguem das ressacas dos não alcoólatras por serem acompanhadas pelo remorso mental, nojo de si mesmo(a) e fortes ataques de tremedeiras. Os “apagamentos” agora são freqüentes. Agora, acorda de manhã tremendo, e precisa de álcool (ou qualquer outro sedativo) para acalmá-lo. Se tomar calmantes enquanto seguir bebendo, colocará sua vida em perigo, pois esta combinação é, freqüentemente fatal.
O Alcoólatra acha que não funciona bem sem uns “golezinhos”. A vergonha que sente faz com que não queira, contudo, que ninguém toque no assunto das bebidas dele. Quanto mais inferior se sentir, mais se utiliza das armas da arrogância, grandiosidade e agressividade. Sentindo-se isolado, procura o convívio de pessoas que bebem com ele. Pensa que são as únicas pessoas que o compreendem, e não está longe da verdade. Alias, esta é uma das chaves do êxito de Alcoólicos Anônimos.

Terceira fase
Agora existe a necessidade imperiosa de conseguir e manter certa quantidade de álcool no corpo o tempo todo. As ressacas, que ocorrem cada vez que o alcoólatra acorda, são sempre apagadas por mais bebida. O doente começa a ver “coisas” e ouvir sons inexistentes. O colapso físico está se aproximando. Suas tremedeiras são violentas, não lhe permitindo levantar o primeiro como do dia à boca com uma só mão. Quase não se alimenta mais, nem se banha. Uma mudança brusca na quantidade de álcool no corpo pode causar o “Delírium Tremens”,um estado físico muito perigoso que requer aatenção médica imediata.
Convencido de ele não tem mais condições de controlar-se, se entrega totalmente à bebida como coisa inevitável. São extremos seus sentimentos de vergonha, degradação, isolamento e auto-piedade. Pensa constantemente no suicídio, mas gostaria de morrer bêbado ou inconsciente, sem passar por dor. É difícil convencê-lo de que poderia voltar a uma vida feliz, pois ha muito tempo que não sentiu a felicidade nos seus períodos de sobriedade